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Júri desclassifica acusação de homicídio doloso no processo que apura morte de jovem em Manguinhos
Notícia publicada por Assessoria de Imprensa em 06/03/2024 21:36

O Conselho de Sentença do 3º Tribunal do Júri da Capital decidiu afastar o dolo eventual e acolher a tese de homicídio culposo no processo que apura a morte de Johnatha de Oliveira Lima, de 19 anos, ocorrida em Manguinhos, na Zona Norte do Rio, em 2014. O acusado pelo crime é o policial militar Alessandro Marcelino de Souza. A sentença foi proferida na noite desta quarta-feira (6º/3), pela presidente do júri, juíza Tula Corrêa de Mello.

Como o Tribunal do Júri tem competência para julgar somente crimes dolosos contra a vida, o processo seguirá para a Justiça Militar.

"À conta de tais razões, atendendo a vontade soberana do Egrégio Conselho de Sentença desta comarca, declino da competência em favor da Justiça Militar por força da competência constitucional prevista no artigo 124 da Constituição da República Federativa do Brasil”.

Julgamento

O julgamento do policial Alessandro Marcelino de Souza teve início na tarde de terça-feira (5/03). Pela acusação, a primeira testemunha a depor foi Glicélia Souza, vizinha e amiga de infância de Johnatha de Oliveira Lima, seguida pela também moradora Fátima dos Santos.

Já a perita da Polícia Civil, Izabel Solange de Santana, durante o interrogatório, narrou que, das 12 armas recolhidas para perícia técnica (sendo 9 pistolas e 3 fuzis), uma foi compatível com a que atingiu Johnatha.

A tia de Johnatha, Patrícia de Oliveira, foi a quarta a ser ouvida. Ela contou que ficou sabendo do crime pelo primo.

“Foi tudo muito rápido. Recebemos a informação que ele foi baleado nas costas, fui à UPA e disseram que estava morto, sendo que vi policiais circulando no interior da UPA e não haviam socorrido meu sobrinho. Quando fui na delegacia registrar boletim de ocorrência, descobri que policiais que teriam participado da ação prestavam depoimento como auto de resistência”, disse Patrícia.

No decorrer do depoimento, Patrícia confirmou a informação de que ocorreu uma manifestação da população em razão da morte de Johnatha e revoltados atacaram contêiner da UPP de Manguinhos.

“Eu tive a ‘missão’ de conseguir testemunhas que concordassem em prestar depoimento em favor de Johnatha. O que aconteceu foi uma covardia. Ele era um jovem bom, sonhava em seguir a carreira do Exército e era apaixonado pela namorada. Se não fosse o braço armado do Estado, ele estava entre nós. Minha irmã criou com muita dificuldade ele e os outros dois filhos. Para uma mulher preta e moradora de favela é muito difícil tudo. Atualmente, ela lidera o movimento ‘Mães de Manguinhos’ que presta auxílio para familiares de vítimas da violência assim como a que Johnatha sofreu”, afirmou.

As quatro testemunhas de defesa eram policiais militares que estavam em operação no dia da morte de Jonathan. A primeira a prestar depoimento foi a sargento Larissa Elaine da Rocha. Ela disse que os policiais foram à comunidade após receberem uma denúncia sobre um ponto de tráfico. Ao chegarem ao local, houve confronto com os traficantes. Larissa afirmou que viu Jonathan com uma pistola, atirando contra os policiais.

“Ao retornarmos, ficamos sabendo que havia um baleado na UPA. Na delegacia havia muitos moradores revoltados. A tia do Doquinha (Johnatha) me acusava de o ter executado a sangue frio”, disse.

O Ministério Público apontou contradição na fala de Larissa Rocha. Na audiência ela teria negado ter visto Johnatha armado. No entanto, no julgamento, ela afirmou que o rapaz portava uma arma e que atirou contra policiais. O Conselho de Sentença decidiu por afastar a tese de falso testemunho apontada pelo MP.

Em seguida, foi a vez do ex-PM Marcelo Nicolau de Carvalho. Expulso da Polícia sob acusação de integrar organização criminosa, Nicolau disse que, após o cerco aos traficantes, os policiais perceberam que um rapaz jogou uma bolsa dentro de uma casa. Ao entrarem na residência, encontraram as drogas. Ele disse que, em retaliação, moradores atiraram garrafas e pedras neles e que a base da UPP foi incendiada e saqueada.

“A Larissa era a que mais sofria perseguições dos moradores, só pelo fato de ser a única mulher”, considerou.

Os sargentos Alexandre Veiga Grande e Anderson Santos da Silva também prestaram depoimentos e contaram detalhes sobre o dia da operação.

Após o do depoimento das testemunhas, teve início o interrogatório do réu. O cabo Alessandro Marcelino de Souza disse que no dia dos fatos efetuou sete disparos com uma pistola ponto 40 contra três homens que haviam encurralado a guarnição da policial Larissa. Mas não viu se atingiu alguém, pois teria se utilizado de uma manilha deixada no local como escudo.

A versão do PM foi diferente da apresentada no primeiro depoimento prestado na delegacia, onde não mencionou que havia feito disparos.  Questionado pelo Ministério Público sobre a contradição, ele alegou que, na ocasião, estava sem advogado e que só respondeu o que lhe foi perguntado.

“Perguntaram apenas se havia atirado de fuzil e eu disse que não”, justificou.

O policial disse ainda que, no momento em que fez os disparos, não havia populares no local.  E que atirou na direção de uma pessoa que estava junto a um poste. Foi então que a promotoria apontou uma segunda contradição: em depoimento prestado na delegacia, o cabo teria dito que havia cerca de 70 pessoas hostilizando a guarnição.  

“Não me lembro de ter dito disso.  A multidão apareceu depois e atacou a base da UPP”, corrigiu.

Ao final do interrogatório, o julgamento foi suspenso e reiniciou na manhã desta quarta-feira (6/03), com as manifestações do Ministério Público e da Defesa e a leitura da sentença.

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MG/ SV/ AB FS