Tribunal de Justiça do Rio realiza primeira sessão de mediação com intérprete de Libras
Até julho desse ano o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) do Fórum da Leopoldina, em Olaria, Zona Norte do Rio de Janeiro, já realizou mil sessões de mediação. Porém, uma delas se destaca pelo aspecto da inclusão. Nessa quinta-feira, dia 12, foi realizada a primeira sessão com uma intérprete de libras (a Língua Brasileira de Sinais). Ela foi convocada para facilitar a comunicação dos mediadores com as partes de um processo da Vara de Família que corre em segredo de justiça. Um homem e uma mulher com deficiência auditiva, que se separaram e discutem a pensão alimentícia para a filha Manuela, de um ano e seis meses.
A quinta, e última sessão do casal, foi realizada em uma das salas da Casa da Família do Cejusc da Leopoldina, um local elaborado de forma específica para realizar as reuniões e outras atividades dos casos de mediação e conciliação. Durante um pouco mais de meia hora o pai de Manuela, Rafael, de 22 anos, pôde se expressar de forma mais clara com as mediadoras, o advogado e a avó materna da criança. Por motivos de doença, Larissa não participou da sessão, e foi representada pela mãe, Carla.
“A comunicação fluiu bem. Fiquei feliz quando cheguei hoje ao Fórum e descobri que teria uma intérprete, já que ainda tinha essa apreensão. A falta de comunicação atrapalha, mas hoje consegui conversar melhor e me sentir mais integrado”, afirmou Rafael, que deu entrevista com a ajuda da intérprete de libras Suzana Alves de Souza.
Aliviado por contar com a ajuda de uma intérprete, Rafael participou ativamente do encontro, com sugestões e ponderações. Para ele, a falta de ajuda para pessoas com necessidades especiais em locais públicos além de gerar um sentimento ruim, desrespeita a Lei de Libras, que garante o direito a intérpretes em órgãos públicos.
“Esse é um assunto muito sério, muito importante, porque em muitos locais não há esse profissional. Fiquei muito satisfeito com a sessão, pois consegui me comunicar melhor com a ajuda da intérprete, que traduzia com clareza o que eu dizia”, disse.
Professora municipal graduada em Letras pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e especialista na comunicação com surdos há dez anos, Suzana Alves de Souza foi a contratada como intérprete. Sentada estrategicamente de frente para Rafael, a professora traduzia para ele cada informação que era transmitida durante o encontro.
Ela ressaltou a preocupação do Tribunal de Justiça do Rio em oferecer a intérprete como forma de promover a acessibilidade. De acordo com a especialista, esses serviços estendem a cidadania às pessoas que não têm seus direitos atendidos.
“Muitas vezes a pessoa surda fica dependente de um familiar ou alguém que não tem o hábito de fazer a tradução para libras, o que dificulta a comunicação e cria barreiras. O andamento de todo o processo pode ocorrer de forma melhor caso seja respeitada a lei que garante o uso dos intérpretes em locais públicos”, destacou.
Para o juiz André Tredinnick, da 1ª Vara de Família de Leopoldina, e um dos coordenadores do Cejusc regional, a mediação concede mais autonomia as pessoas, pois privilegia a conversa e estimula um ambiente de participação e compreensão. Segundo o magistrado, a iniciativa retira o aspecto severo dos processos judiciais e garante os direitos das pessoas com necessidades especiais.
“É muito importante que a gente ofereça esse serviço, até porque a mediação é baseada no diálogo. Isso não é um favor, é um direito, já que as pessoas não podem ser impedidas de participarem desses atos por causa de suas deficiências, e o Estado precisa garantir que ninguém seja discriminado”, afirmou.
A advogada Evelyn Castillo, que mediou as reuniões entre Rafael e Larissa, começou a sessão lembrando aos pais da importância de uma conversa específica entre as partes, a fim de estabelecer medidas que beneficiam a filha do casal. Ela destacou a importância da intérprete para a homologação do acordo entre os pais.
“As audiências com pessoas com deficiência podem ter muitas dificuldades, então essa novidade foi fundamental para atender às necessidades e encerrar essa conciliação de forma satisfatória. Como mediadora, foi muito bom ter uma ajuda dessas, pois cria um canal mais claro de comunicação, evitando problemas”, celebrou.
A Lei de Libras (Lei 10.436/2002) foi sancionada em abril de 2002 e reconhece a Língua Brasileira de Sinais como forma legal de comunicação e expressão. O artigo 2º estabelece que os serviços públicos devem apoiar o uso e a difusão daquele tipo de língua, e o artigo 3º garante que as instituições e concessionárias de serviços públicos devem prestar o atendimento adequados aos portadores de necessidades de deficiência auditiva.
JGP/JAB
Fotos: Brunno Dantas/TJRJ