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Discurso de posse do desembargador Claudio de Mello Tavares
Notícia publicada por Assessoria de Imprensa em 04/02/2019 16:56

Senhores magistrados, membros do Ministério Público, Defensores Públicos, Advogados, Procuradores do Estado e de Municípios, Serventuários, Parlamentares, demais Autoridades, Familiares e Amigos, Senhoras e Senhores.

A temporariedade no exercício dos cargos públicos e dos mandatos eletivos leva à periódica realização de cerimônias como esta, de saída de alguns após o desempenho do mandato, e de assunção daqueles escolhidos pelos órgãos constitucionalmente legitimados  para exercer responsabilidades políticas e administrativas no período que ora se inicia.

Naturalmente, é momento de realização pessoal para todos que assumem hoje novos cargos na Administração deste Tribunal de Justiça, o qual, de acordo com dados oficiais do Conselho Nacional de Justiça, foi, no ano passado, o mais produtivo do país.

Não se trata, no entanto, de episódio de relevância meramente pessoal, porque a alternância neste Poder da República é de interesse de todos que dele podem precisar se socorrer.

A expectativa é, portanto, das mais elevadas, como também o é a responsabilidade que passa a recair sobre os ombros dos ora empossados em novas e honrosas funções. Em particular sobre os meus, no exercício da Presidência, em missão confiada pelos meus respeitadíssimos pares.

Gostaria, inicialmente, de compartilhar com os senhores um desejo: o de ver um Judiciário forte, unido e prestigiado a ocupar o lugar que merece no cenário social e político deste País. Um Judiciário à altura de seus valorosos integrantes e que possa colaborar efetivamente na construção de uma sociedade livre, mais justa, fraterna e solidária, como determina nossa Carta Constitucional, a qual todos nós, Magistrados brasileiros, de forma uníssona, juramos respeitar e defender.

Entre as promessas generosas da Constituição de 1988 e a realidade do nosso País, ainda há um abismo. Ela fala em justiça social, mas o Brasil continua sendo um dos países mais desiguais do mundo. O constituinte exige a moralidade administrativa, mas a corrupção viceja em diversos níveis da Administração Pública.  Muitos outros exemplos poderiam ser lembrados para evidenciar o óbvio: nossa Constituição ainda está longe de ser plenamente efetiva.

O poeta Carlos Drummond de Andrade observou em seu poema “novo tempo”, com razão, que “as leis não bastam, pois os lírios não brotam das leis”. Impõe-se que nós, Juízes e Juízas brasileiros, não permitamos nunca que as nossas mentes se limitem a raciocínios abstratos, indiferentes à sorte das pessoas. O processo tem de ser visto como algo capaz de encontrar soluções objetivas e tão rápidas quanto for possível.

A atuação do Poder Judiciário deve ser pautada em prol da efetivação dos direitos fundamentais e sociais. É isso o que a sociedade brasileira espera: que o Poder Judiciário seja – verdadeiramente – um produtor de justiça.

Para tanto, o Poder Judiciário não pode ser compreendido como mero aplicador técnico da lei. Sua atuação precisa – sem perder o horizonte da aplicação clássica da lei – estar atenta aos interesses e aos anseios da sociedade. A decisão judicial, sobretudo em virtude do papel relevante da jurisprudência, entrega mais do que a solução de um conflito com atenção às normas jurídicas. Ela também serve como baliza para condutas futuras.

Jamais nos esqueçamos de que, em cada processo judicial, julgamos um capítulo ou toda uma vida, uma liberdade suprimida, um pouco de um patrimônio ou todo ele, a reparação de uma honra esmagada, uma esperança em busca de justiça.

Estamos diante de um mundo em permanente mutação: globalização, avanços tecnológicos, novas descobertas científicas e relações sociais complexas. O Poder Judiciário, por sua vez, passa por uma mudança de paradigmas em sua gestão administrativa e judicial. Com a ampliação dos seus serviços e da sua atuação, decorrente das exigências e necessidades da sociedade contemporânea, ele parte, cada vez mais, para um modelo gerencial, onde conceitos e termos clássicos das organizações privadas passam a fazer parte do cotidiano das organizações públicas: planejamento, finalidades, metas, resultados e  indicadores estatísticos.

Criatividade e conectividade são as palavras-chaves a impulsionar e qualificar o trabalho. Diante das adversidades, várias alternativas são criadas, demonstrando empenho, entusiasmo e operosidade de magistrados e servidores. Encontram-se saídas que geram resultados, satisfação e reconhecimento da sociedade. Essas ações precisam ser difundidas. O intercâmbio de experiências é fundamental para o aperfeiçoamento da máquina.

A sociedade fluminense clama por resposta judicial efetiva, que previna e equacione os conflitos em tempo hábil. Essa é a diretriz estratégica da nossa gestão: elevar à primazia absoluta a qualidade da prestação jurisdicional.

Toda e qualquer revisão de nossas estruturas organizacionais terá por escopo assegurar melhor apoio às atividades vinculadas à entrega da prestação jurisdicional.

Ainda enfrentamos acentuada crise econômica e social. Restrições de ordem financeira, certamente, imporão austeridade e criatividade. A nota positiva é que funcionam plenamente as instituições democráticas. Nessa conjuntura, e observados os mecanismos constitucionais e legais, surge a esperança de que advirão tempos melhores.

A missão deste tribunal é proporcionar à sociedade acesso à justiça e resolução dos conflitos por meio de um atendimento de qualidade, promovendo a paz social. Nossa Administração estará voltada à agilidade e à eficácia na prestação jurisdicional, com dedicada atenção aos processos judiciais e administrativos eletrônicos. Asseguramos também o empenho da Corte em cumprir as metas do Conselho Nacional de Justiça.

A sociedade espera do Judiciário uma atuação firme e serena, ciente de que o respeito às suas decisões constitui a essência do estado democrático de direito, com o qual temos um compromisso inarredável.

Colegas Magistrados

Os Magistrados também são cidadãos. São servidores do povo. Como asseverou Calamandrei, em seu célebre livro “Eles, os juízes, vistos por um advogado”, “o drama do juiz é a solidão, porque ele, que para julgar deve estar livre de afetos humanos e situado um degrau acima dos semelhantes, raramente encontra a doce amizade que requer espíritos do mesmo nível. O drama do juiz é a contemplação contínua das tristezas humanas”.

A função judicante é solitária. Diante das situações de fato e das teses jurídicas que são postas pelos advogados de ambas as partes litigantes, cabe ao Magistrado decidir qual a melhor solução para o caso que se lhe apresenta. O exercício da magistratura é uma função essencial à República e imprescindível à cidadania. Mas tal exercício somente ganha sentido se colocado em razão de um fim maior, a distribuição da justiça.

Vale destacar aqui a independência dos Juízes no exercício da judicatura, em meio a ruídos de pressões políticas e da opinião pública. Registro ainda o esforço da magistratura para colocar o serviço jurisdicional em dia com a sociedade e o papel fundamental da AMAERJ, nossa associação, no fortalecimento do poder judiciário.

Além de serem detentores do poder para dirimir conflitos, os juízes devem representar um ponto de equilíbrio para a sociedade, assegurando a organização básica, a convivência pacífica e os direitos aos vulneráveis. Raras são as profissões que exigem tanta serenidade como a dos Juízes. E os tempos atuais estão mostrando  sua importância para o respeito ao nosso sistema constitucional.

O Papa Francisco, em encontro com membros do Conselho da Magistratura italiana, em 17 de junho de 2014, após destacar a ética que reveste o trabalho dos Magistrados, elencou as características que um Juiz deve possuir, tendo em vista a importância do seu papel na sociedade, salientando a prudência como um fator dominante:

“É uma virtude de governo, que inclina a ponderar com serenidade as razões de direito e de fato que devem estar na base do julgamento. Terá mais prudência se tiver um elevado equilíbrio interior, capaz de dominar as pressões provenientes do próprio caráter, das próprias visões pessoais, das próprias convicções ideológicas”.

Eminentes Advogados, Procuradores dos Estados e Municípios, e membros do Ministério Público e da Defensoria Pública,

Pretendemos manter um permanente diálogo com as instituições essenciais à administração da Justiça,  cujos objetivos convergem integralmente conosco no tocante ao aperfeiçoamento da jurisdição.

Já fui militante da Advocacia e da Ordem dos Advogados. Conheço as suas angústias porque as sofri. Advoguei anos, até chegar ao Tribunal de Justiça representando essa nobre classe. Desde a minha posse, há mais de 22 anos, sempre defendi os direitos da Advocacia por reconhecer a sua importância e a necessidade do seu fortalecimento.

Para tanto, tenho por intocáveis a autonomia e a liberdade profissionais do Advogado. Por isso é que desejo e espero que a Ordem dos Advogados do Brasil cultive o espírito de colaboração e harmonia, de modo a se construir uma convivência profícua e respeitosa.

Destaco, ainda, o papel constitucional da Advocacia de assegurar, na esfera jurídica, o respeito aos direitos dos cidadãos, para tanto provocando o Judiciário à solução de conflitos, à reparação dos direitos violados e à observância dos postulados básicos do nosso sistema jurídico, instigante prática que, em grande medida, é responsável pela evolução do Direito e da jurisprudência.

Reverencio os Procuradores do nosso Estado e dos Municípios que o integram, Advogados públicos que têm a missão constitucional de zelar pelo interesse público, do estado-administração, compatibilizando as políticas públicas desenhadas pelos representantes eleitos do povo às molduras do ordenamento jurídico. Oferecem ao administrador as interpretações possíveis e indicam riscos, nunca transigindo com pretensões que transbordem desses limites.

Guardo admiração e respeito pelo Ministério Público, a quem a Carta de 1988 atribuiu a ampliada função de defesa do interesse público, a fim de preservar as rotas da cidadania em prol de todos, exercendo iniciativas de rara eficácia para atingir objetivos da maior relevância. Sempre recebemos com respeito as suas manifestações, por vezes utilizadas como orientadoras dos nossos julgamentos.

Neste momento em que o Brasil se vê passado a limpo em todos os segmentos da vida social e institucional, destaco a atuação essencial do Ministério Público na defesa da ordem jurídica e do regime democrático, conduzindo ações de combate à corrupção e à impunidade.

A nobre Defensoria Pública, por sua vez, é conceituada pela Constituição de 1988, no seu art. 134, como a “instituição essencial à função jurisdicional do estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados”, assegurando-lhes efetivo acesso à justiça.

O fortalecimento e a valorização dessa instituição são conquistas inalienáveis de toda a sociedade brasileira e permitem o desempenho do seu papel de protagonista no estado democrático de direito, na orientação, conscientização e concretização dos direitos dos cidadãos, na redução das desigualdades sociais e regionais, na erradicação da pobreza e da marginalização.

Caros Servidores e Servidoras do TJ,

Todas as nossas ações dependem da atuação dos Serventuários deste Tribunal de Justiça. Do seu eficiente e criterioso trabalho profissional, que, muitas vezes, a contabilidade dos feitos não registra, resulta a própria eficácia das decisões judiciais.

No cotidiano, os senhores se deparam com inúmeras dificuldades. Vivenciam problemas, ouvem críticas e anseios. Lidam, diretamente, com dor, aflição, pressa e ansiedade daqueles que clamam por justiça.

Contamos com o apoio desses profissionais de elevado senso de responsabilidade e espírito público, comprometidos com a missão, a visão e os valores institucionais. Os Senhores têm a força e a competência de que este Tribunal precisa para alcançar novos patamares de modernização e eficiência.

Amados familiares, amigos e membros da minha equipe,

Encontro, na minha família, os pontos cardeais da minha vida: a presença constante do espírito do meu pai a me guiar e advertir, pois os mortos são uns invisíveis, e não uns ausentes, como dizia o poeta francês Victor Hugo; a dedicação e o afeto da minha querida mãe, Maria Teresa, a quem devo tudo o que sou e que, com suas orações diárias, tece o manto que me protege; o amor pelos meus filhos, Mateus e Bernardo, e o dever de inspirá-los nas atitudes e decisões; a permanente e cativante companhia da minha mulher, Glaycianne, a iluminar o meu caminho; o meu querido irmão, Marcelo, amigo de todos os momentos. Compõem eles a minha riqueza d’alma, a palavra que não preciso inventar. Também não posso esquecer os meus demais parentes e amigos, tão fiéis quanto generosos, nem tampouco meus assessores e diretores da Corregedoria, Juízes Auxiliares e todos aqueles que comigo trabalharam ou trabalham, sem os quais não seria capaz de enfrentar os desafios profissionais e prosseguir na minha missão.

A minha experiência como Corregedor-Geral me permitiu maior conhecimento do Poder Judiciário, tanto na sua estrutura administrativa quanto em relação à realidade de sua organização física, suas instalações nas diversas Comarcas, seus Servidores e Magistrados. Isso me preparou para os desafios a serem enfrentados na condução da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Buscarei defender veementemente o Poder Judiciário e as prerrogativas dos Magistrados, tanto na esfera estadual quanto na federal, e estabelecer franco diálogo com o senhor Governador e o senhor Presidente da Assembleia Legislativa para manutenção do equilíbrio entre os Poderes, com intransigente defesa de garantias, independência e autonomia do Poder Judiciário.

Para se alcançar tal desiderato, não é necessário eliminar o debate, o qual deve ser claro e franco, com equilibrado senso. Na condução deste Tribunal, sei que poderei contar com o conselho sapiente de todos os meus queridos colegas.

A jornada humana é uma sucessão de etapas que se superpõem, as quais nos cabe procurar conduzir. Entendo que somos, até certo ponto, os detentores do nosso futuro. Em grande parte, o rumo da nossa existência depende de nossa vontade, nossa determinação, nossa persistência, nossa perseverança, nossa crença e nossa fé.

O Brasil tem pressa, e é fundamental consolidarmos a nossa democracia, em que todos sejam filhos de um Brasil comum nas escolas, nos bairros, nas empresas, nas cidades, nas universidades, na vida pública, concedendo-lhes mais justiça e paz, além de saúde, emprego, segurança e educação. Havemos de encontrar saídas para escapar do caos e da violência do nosso tempo, retomando a fé e a esperança em um Brasil mais equânime.

Rejeitemos por princípio a indiferença, destruidora de almas e grave óbice à construção da cidadania.

Imbuído do sentimento obreiro, que se soma à gratidão aos que contribuíram com a minha chegada a este importante cargo, é que acredito nesta missão. Tenho certeza de que andaremos juntos, respeitando o passado desta instituição centenária, prestigiando o presente com foco no futuro, visando ao aperfeiçoamento da administração pública em benefício dos cidadãos.

A sociedade necessita de uma magistratura consciente da sua missão, que dê efetividade à prestação jurisdicional, fazendo do direito instrumento de transformação social. Disposta ao sacrifício, pronta a solucionar problemas.

Peço a Deus que me faça chegar ao final da minha jornada na Presidência desta Corte com o direito de olhar nos olhos de todos aqueles que, hoje aqui presentes, dignificam esta solenidade. Para tanto, peço a Nossa Senhora Aparecida e a São Judas Tadeu, que há tantos anos por mim advogam junto a nosso Deus, proteção, inspiração e um profundo espírito de serviço.

Senhoras e Senhores, os desafios são grandes, mas as ideias, a disposição para trabalhar e a vontade de acertar e fazer o melhor são ainda maiores. Sabemos da nossa responsabilidade e do nosso compromisso para com a sociedade.

Muito obrigado e que Deus nos abençoe.